segunda-feira, 21 de março de 2011

Predisposição genética associado a fatores ambientais




Navegando em sites relacionados com psicologia, encontrei alguns artigos, como este de 1974, intitulado "Tratamento comportamental de comportamentos de papéis sexuais desviantes em uma criança masculina" e resolvi dar uma investigada. 

O garoto do estudo, Kraig, tinha quase 5 anos e apresentava "comportamentos femininos" como "(a) preferência por roupas de outro gênero, (b) uso real e imaginário de artigos cosméticos, (c) gestos afeminados, (d) aversão à atividades masculinas e preferência por brincar com meninas e atividades femininas, (e) preferência no papel feminino, (f) tom de voz feminino e conteúdo predominantemente feminino nas falas e (g) afirmações verbais sobre desejo ou preferência de ser uma menina". Ou seja, comportamentos tipicamente chamados de "transtorno de identidade de gênero" (menos na França, que a partir de 2010 não considera mais a transsexualidade como transtorno mental).

Embora o experimento seja um tanto controverso, principalmente nos dias de hoje em que não se vê mais as diferenças em gostos sexuais como "doença", deve-se admitir que o delineamento experimental dele é maravilhoso. A mãe foi ensinada a reforçar comportamentos "masculinos" e extinguir comportamentos "femininos" usando atenção social na clínica e economia de fichas em casa.

Na clínica a criança ficava em uma sala com vários brinquedos, "masculinos" e "femininos", e o experimentador a assistia em outra sala por trás de um espelho unidirecional. Em outros momentos, a mãe ficava na sala com a criança usando um fone de ouvido segurando um livro, e o experimentador dava instruções para ela de como se comportar. Por exemplo: quando o garoto brincava com bonecas ou falava em ser mulher, era pedido que a lesse o livro e ignorasse a criança; quando o garoto usava brinquedos como bonecos ou armas de borracha, a mãe era instruída a interagir com ele, sorrir, dar atenção, etc. Em casa, estes comportamentos eram reforçados com fichas que podiam ser trocadas por uso da televisão, barras de chocolate e outros estímulos agradáveis.

Uma curiosidade: na primeira vez que a mãe ignorou o comportamento feminino de Kraig, a birra foi tão grande que tiveram que parar a sessão e iniciar novamente após um intervalo. Outra: a sessão em que Kraig mais emitiu verbalizações femininas foi quando um outro adulto foi colocado dentro da sala.

No final das contas os comportamentos afeminados diminuiram drasticamente e os masculinos passaram a ocorrer mais. Três anos depois os experimentadores voltaram a checar a criança e o resultado ainda tinha se mantido. E este é só o primeiro de vários outros experimentos semelhantes.

É muito comum ouvir alguns homossexuais dizerem que são assim "desde pequenos" e transsexuais dizerem que se sentem como "um sexo dentro e outro por fora". Afirmações como essas nos levam a crer que haja um fator genético por trás. A explicação que usamos hoje é o clichê entre todos transtornos mentais: "predisposição genética associado a fatores ambientais", mesmo que não saibamos exatamente qual gene ou quais fatores causem as alterações.

Pensando deste modo, este estudo mostra que a atenção seletiva dos pais estava interferindo na escolha de gênero da criança (como no episódio de birra quando a mãe o ignorou). Na era em que só se fala em genoma humano e neurotransmissores, não podemos deixar de lado também os fatores sociais e culturais.

O assunto é controverso e  deixa uma interrogação: Será que o comportamento ''normal'' da criança era aquele e o tratamento apenas a adequou ao que os pais gostariam que fosse o normal ?
Acredito que não dá para saber se o comportamento "normal" da criança é o que ela apresenta "espontaneamente" ou o que ela apresenta após o tratamento, pois ambos estão sendo controlados pelo ambiente, a diferença é que no tratamento esse ambiente é deliberadamente manipulado enquanto que no outro caso os pais e vizinhos e amigos etc não sabem que estão exercendo este controle.